terça-feira, 27 de março de 2012

Reorganizar a Sociedade

Para discorrermos sobre a sociedade contemporânea devemos enfocá-la em um plano histórico amplo, dividido em etapas, desde a sua organização primitiva e sua marcha progressiva. Analisar a história e relembrar princípios que regeram os destinos da humanidade.

A colocação do professor Alex Villas Boas nos remete a Augusto Comte¹, um dos estudiosos que afirmou em seus inscritos que a sociedade tinha chegado a uma encruzilhada e que deveria decidir em se extinguir ou se reorganizar. É muito interessante e intrigante esse estudo, realizado no século XIX, pela clareza de seu desenvolvimento, sem adentramos no mérito de sua execução.

Vejamos a similaridade no modo pensante da crise social, sem esquecermos de que não há como negar que todo sistema é continuidade e consequência dos anteriores. Recordamos aqui uma das aulas de Antropologia Teológica sobre a teodiceia, onde nos foi esclarecido que o novo tende anular o velho visto em épocas de mudanças/Mudanças de épocas, porém, a anulação não implica desmembramento, pois se faz presente “a causa e o efeito” e “a ação e a reação”, ou seja, do velho se faz o novo e gera uma continuidade na linha do tempo e espaço. O novo sistema está atrelado aos anteriores mesmo com as mudanças ocorridas.

Quando se busca “mudança” é porque a sociedade foi se depurando gradualmente, desde suas origens, eliminando mazelas seculares, superando sistemas inadequados de gerir o social, como vemos ainda nos dias atuais a ingerência da religião na política e no governo de povos, em direção a uma afirmação positiva de valores individuais incluídos no grupo social, podemos citar Peter L. Berger² e sua analogia da sociedade como palco de teatro, e cabe ao indivíduo optar por sua colocação, como agente participativo, coadjuvante ou meramente expectador. Podemos verificar uma contínua e progressiva marcha da sociedade, propondo ir em direção à sua maturidade³ (?) politicamente inserida na comunidade que se identifica com sociedade (sistema social organizado em prol do indivíduo). O estágio atual da civilização se configura como uma situação de limite, onde a sociedade corre o perigo de mergulhar em uma anarquia moral e política, risco ao estado pleno e definitivo da espécie humana, ressaltando valores positivos do homem e do sistema social para instaurar uma sociedade voltada para o objetivo supremo da perfeição. Temos aqui a visão(4).

Vamos analisar neste opúsculo os meios para atingir o objetivo, as crises a superar e as tendências a apoiar, para isso, privilegiaremos três aspectos (estágios): teológico/fictício (inicial), metafísico/abstrato (secundário), científico/concreto (definitivo). Um novo sistema que tende a se constituir é o de caráter fundamental destinado à época atual pelo andamento geral da civilização. Movimentos distintos e opostos agitam a sociedade: um, onde a sociedade é conduzida para uma anarquia moral e política que a ameaça para o estado social de conflitos e destruição de valores. Outro, onde a sociedade é conduzida para o estado social definitiva de valorização da espécie humana, por meios de aplicação mais direta. Semelhanças ao método positivista à parte, frisamos a influência de outros estudiosos na análise da reorganização da sociedade: Karl Marx, Émile Durkheim, Max Weber, Friedrich Engels. Os clássicos da sociologia. A preponderância que a tendência crítica ainda conserva é o maior obstáculo para a marcha progressiva e a anulação do atual sistema, sendo a causa primeira desses abalos, que se repetem sem cessar e que acompanham sempre a crise.

A única forma de deter a anarquia que invade dia após dia a sociedade é determinar a deixar a direção crítica (moral) para tomar a direção orgânica (ética), envidar os esforços para a formação do novo sistema social, objetivo definitivo da crise. É a primeira necessidade da época atual. Um exame sumário das coisas que impedem a sociedade de tomar a direção orgânica deve preceder a exposição dos meios a empregar para convencê-la a se empenhar. Os múltiplos e contínuos esforços feitos para reorganizar a sociedade, provam que essa necessidade é sentida. Mas de modo vago e impreciso, as tentativas contêm vícios em suas relações e podem não obter êxito e assim, não conseguir algum resultado orgânico e só contribuem para prolongar a crise.

Reter a sociedade na direção crítica é abandoná-la como presa das revoluções. Basta um olhar para as tentativas de reorganização empreendidas para compreender o estado atual em que se encontra a sociedade, impelida ao antagonismo, ao paradoxo e ao ambíguo. O primeiro erro que se possa apresentar é unicamente o restabelecimento puro e simples teológico/fictício em toda sua plenitude. Por mais quimérica que seja se apresenta aos “espíritos de boa fé” como remédio para a crise atual, apesar de sentirem necessidade de uma reorganização, porém, eles não levam em consideração a marcha geral da civilização, encarando somente sob um único prisma e não percebem a tendência da sociedade para o estabelecimento de um novo sistema, mais perfeito e consistente.

Do ponto de vista dos governantes, eles percebem maior evidência o estado de anárquico da sociedade, por conseguinte, experimentam com mais intensidade a necessidade de remediar esse estado. A omissão dos governantes não é devida, como creem, a causas recentes, isoladas e de algum modo acidentais. É, portanto, o princípio da crise. A decadência desse sistema se efetua de modo contínuo durante década, precedentes em consequência de modificações independentes da vontade humana, para as quais todas as classes sociais concorreram e muitas vezes os próprios governantes foram os primeiros agentes ou os mais ardentes promotores. Fazer a sociedade retroceder até a época em que a crise começou a se pronunciar é inadmissível, além de impossível, pois só recolariam a sociedade na situação que a crise necessita. Para chegar a isso teriam de anular um a um todos os progressos da civilização que causaram as perdas.

Sim, é fato, todo progresso gera perda, inclusive de valores, portanto, o que fazer para evitar essas perdas e de que forma? Faremos uma pausa para debatermos essa primeira parte e para a exposição das colocações dos colegas e assim, analisarmos as visões racionais referentes ao tema. Após a finalização do debate dessa primeira parte daremos continuidade na publicação do texto que faz parte do estudo sobre Reorganizar a Sociedade. Participe!

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1. Augusto Comte. Plano dos Trabalhos Científicos Necessários para Reorganizar a Sociedade. Maio 1822.
2. BERGER, Peter L. Perspectivas Sociológicas: Uma Visão humanística. Petrópolis: Vozes, 1986. 3. Necessários elementos essenciais para estabelecer-se como valor supremo e polo de integração do homem pelo homem.
4. O que se almeja, para onde se deseja ir e alcançar, inspiração”.